6.5.13

Esse bocadinho de memória sensorial


Era de manhã cedinho, com aquele friozinho bom para as cobertas. Nem a mais e nem a menos. As luzes ainda entrando tímidas pelas frestas. Começou o vento forte. A água da chuva já encharcava a cortina pela fresta semi-aberta da janela. O alvorecer preguiçoso virou um turbilhão. Muita chuva e tanto vento que faziam janelas e portas tremerem. Fiquei entre o dormir e o temos atento: "minha janela vai voar já, já"! Era o pensamento constante e atrevido que me tirava a chance de me entregar ao restinho que  me sobrava de tempo antes da vida cotidiana começar para mim. Como ventou no Rio de Janeiro hoje. A piadinha da internet (foto) foi totalmente válida.

Antes de sair de casa, água e vento já haviam cessado. Resquícios de um temporal nas árvores caidas, chão molhado, sinal apagado. Clima de outono no ar: sol quentinho e sombra fria. Eu gosto. Voltei 10 anos no tempo. Quando morava fora do Brasil, fui para um lugar onde pude experimentar o que são as quatro estações. O outono continua a ser a minha preferida em qualquer parte do globo. Lembrei que naquela época a gente saiu do outono para o inverno assim: uma semana inteira de chuva. O mesmo clima agradável, porém molhado. E então: frio! A cada dia mais congelante. O céu de um azul dos mais bonitos que já vi. Quer dizer: emoldurado pela janela por dentro da casa com calefação. Lá fora era sempre necessário mais um casaco.

Hoje, indo para o trabalho, vi os garis tirando das estradas e calçadas a obra do vento e da chuva. Uniformes. Lembrei do meu uniforme de chuva da época em que morei fora. Ao vê-lo, torci o nariz e cheguei a duvidar que um dia fosse usá-lo. Era um macacão de calças amarelo vivo com uma capa de chuva por cima. Era a mistura do Mario Bros (versão canarinho) com a Turma do Pica-Pau no desenho das Cataratas.
Horrível. Mas minha indisposição não durou dois dias de chuva. Usava sempre e aprendi a ver valor nas coisas além da forma. Larguei de mão. Obviamente, dou graças a Deus por poder olhar a chuva da janela do escritório agora. Mas volto à memória com um passado de superação. Todos temos um. Fui feliz lá - de capa amarela parecendo uma encanadora, um fandangos fora do saco ou um pontinho amarelo no meio dos brinquedos  -, sou feliz aqui na minha cidade com meu guarda-chuva preto e lembrando de um trecho curioso do passado. Uma lembrança que foi despertada atráves de chuvas, ventos e raios quentes de sol. Sendo outono aqui ou lá, gosto de sentir o vento gelado a acariciar os cabelos e poder ficar me esquentando nos raios quentinhos do sol. Fiz isso lá, fiz isso hoje, na hora do almoço, aqui. Ficaria feliz, creio, sempre que acessasse esse bocadinho de memória sensorial.    

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