29.8.14

O ponto de não-retorno

Um relato muito pessoal e em construção:
 
Antes
 
Não aconteceu de um dia para outro. Porém, as etapas foram bem definidas. Fui morar fora pesando 50 kg e voltei com 10 kg a mais na bagagem corpórea. Desinchei, mas não emagreci. Um ano fora e ninguém falava de saudade, apenas dos quilos extras. Coloquei um piercing, novidade na época, e tentava desviar o foco para o novo artefato, mas nada resolvia. Estar gorda era sinal de que me deixei destruir durante a viagem. Demorou um tempo até que as pessoas se acostumassem ao meu corpo. Eu já tinha comprado roupas novas, guardei no fundo do armário as que não serviam. Era como se o corpo não fosse meu, mas objeto de apreciação alheia.

Aliás, desde que nasci apenas uma vez perdi peso. Foi na época do vestibular, quando estudava de domingo a domingo: eu tinha que entrar para a faculdade pública! Foco e meta. Faca na caveira. Todos os meus horários ficaram regrados, de comer, de dormir, de estudar, de respirar. Pouco dinheiro para ir ao restaurante todo dia. Escolha consciente no prato para ficar "nutrida". Fui de 42 para 36. Voltei da América, anos e anos depois, a bordo do 42/44, mas com retenção de líquido até na lágrima! Uma coisa. Fiz esse arco de 36 para 42/44 - sem quadril e nem glúteos fartos! rs  

A segunda etapa se estabeleceu quando entrei em depressão. Não perdi peso, nunca perdi depois daquela única vez, e o 44 se estabeleceu de vez na minha vida. Há dois anos, ou menos, num curto período de tempo, 6 meses, engordei 18kg. Numa talagada só. O alarme já havia soado há muito tempo. Já estava na academia, malhando com regularidade e seriedade. Três meses depois de malhar todos os dias da semana, perdi 200gr. Só. Basicamente uma ida ao banheiro. Não podia ser normal. Sou diabética, já não usava açúcar. Também tive um problema de saúde que me obrigou a ficar de 10 dias só me alimentando de líquido. Fiquei 30 e, adivinha? Engordei. O ponteiro da balança subia e minha autoestima baixava em progressões nunca antes vistas por mim.

Se eu comia muito? Não! Se eu beliscava? Não! Mas estava comendo errado. O meu corpo já não me pertencia. Todo mundo notava. Eu notava. Fugi das fotos. Fugi dos eventos. Fugi das pessoas. Fugi do trabalho. Fugi de mim. Novo alarme. Não tinha mais controle sobre meu corpo, que obviamente não estava mais funcionando direito. E você não fez nada para mudar isso? Nem a minha endocrinologista compreendia a engorda, porque meus exames de sangue estavam normais para a questão. Fazia ginástica. Comia de três em três horas. Nenhuma roupa mais cabia ou ficava legal. Nessa época, tive que comprar uma bermuda e só servia a 48. Coloquei de volta no cabide e comecei a buscar outro tipo de ajuda. Não porque tinha vergonha de ser gorda, mas porque meu corpo não estava comportando os quilos a mais. A Coluna já rangia nessa época. Dor. E porque não tinha estrutura para estar tantos quilos acima: uns 25 a 30. Fugi da balança também. 

Fazendo uma matéria, cheguei ao Dr. Tércio Rocha. Ele sacou na hora que eu tinha um problema de tireoide. Levei meus últimos exames de sangue: Bingo! Não estava no sangue, mas estava quase. Os outros sintomas eram claros: cabelo caindo, engorda sem motivo, 20 horas de sono e ainda tinha sono, irritabilidade, rosto e pescoço deformados... Descobri que existem falsos amigos da dieta, tipo o tal biscoito água e sal, barrinha de cereal e afins. Eu estava com intolerância ao glúten. Cortei farinha branca e lactose. Bebi o dobro de água. No primeiro mês, perdi 5kg! E depois fui de quilo em quilo eliminando o que não me pertencia. Não queria virar maromba ou uma daquelas meninas que dá dicas no Instagram (nada contra elas, adoro, mas não era a meta!), mas depois de perder 15kg até agora, eu entendi o motivo delas gostarem tanto de tirar foto!

Meu corpo voltou a funcionar! O ponteiro da autoestima está subindo como foguete. Continuo com restrições, mas não passo fome. Parei de malhar, mas se voltar, vou potencializar meus ganhos, eu sei! Meu corpo está funcionando e isso me emociona, porque durante muito tempo cada quilo a mais no meu corpo me foi jogado e julgado como culpa de um relapso meu, como preguiça, falta de vontade, relaxo. Culpa, culpa, culpa. Pior, há quem pense que o gordo não é legal. Para! Quem acusa não percebe que por trás de um corpo – seja ela qual e como for – existe uma pessoa. Que sabe. Que tem sentimentos. E que talvez não encontre o ponto de não-retorno, a mola mestra para mudar. Porque além do peso dos seus quilos, há quem carregue o peso da culpa e o peso do julgamento de terceiros.

Hoje

Não cheguei lá! Falta e muito, a meu ver! Sempre vai faltar, não porque eu quero ser esquelética, mas porque quero ser o resultado dos frutos do meu esforço. Rumo aos 5kg finais! Se eu consegui, você consegue. Acredita!

27.8.14

Tudo era calma. Alma.

Herdei dos meus pais essa mania de “puxar papo”. Os dois tinham esse hábito, meus irmãos também têm. Cada um do seu jeito. O mais velho é piadista; o do meio, atencioso. Eu? Gosto de um papinho mesmo. Curiosidade sobre a história que a pessoa tem a dizer, o que me rende bastante material vivo para a escrita, dentre outras coisas.

No novo trabalho já conversei com muita gente de outros setores. Os do setor de Serviço, principalmente. Adoro! Outro dia, entrei no banheiro e tinha uma reunião delas. Reunião mesmo. Um círculo de mulheres uniformizadas contando seus casos, suas dores. Um grupo de apoio se formou e se desfez assim que entrei. Fiquei envergonhada de ter aparentemente "interrompido" aquele momento. Bem poderia ser uma oração. Quem sabe? Tudo bem que não era a hora (expediente) e nem lugar (banheiro). Mas tenho pra mim que as trocas verdadeiras podem ocorrer sem horário ou local determinado.

Depois que resolvi a questão que me levava até ali, vi que ficou apenas a responsável pelo setor. Perguntei se estava tudo bem e ela me contou:
“Tenho um filhinho de quase dois anos que passou mal de bronquite de madrugada. Há dois dias que não durmo, porque ele tem falta de ar. Agasalhei meu filho e levei para o hospital. A médica disse que era exagero meu, que não era bronquite e era uma irresponsabilidade eu sair naquele frio com a criança. O menino tem falta de ar direto, já estava ficando roxinho, não comia... Fui com ele para o hospital e disse à médica que não seria maluca de sair com a criança passando mal, sem estar agasalhada. Ela só receitou descongestionante e fui para casa”.
Vocês podem imaginar meu coração derretendo nessa hora, não é?

Fiquei tão comovida – e passei isso para ela – que ela me perguntou se eu tinha um bebezinho também. Sem graça, talvez por ter demonstrado amor demais em um tempo de desamor... Disse apenas que gostava muito de crianças, mas que não era mãe. Ela me contou outra história:
“Não fica triste. Lá na minha igreja, todas as minhas amigas foram mãe cedo. Eu com 25 anos, não era mãe, mas desejava muito. Só aconteceu agora e eu tenho 35 anos. O nosso tempo, não é o tempo de Deus. Um dia você será mãe, acredita!”.
Se eu vou ser mãe de verdade, só Deus mesmo para saber... Mas o que mais gostei de ouvir dela foi: “O nosso tempo não é o tempo de Deus”. Vivemos dias tão corridos, que anda difícil até arrumar uma horinha para comer sossegadamente, ligar para um amigo pra nada, pensar em livre devaneio! Nesse turbilhão de acontecimentos, a gente quer correr para realizar os nossos sonhos e cada um dos sonhos tem seu tempo certo, exato, específico para acontecer na vida. Na correria do cotidiano, atropelamos nossa história, nossos sentimentos, o curso certo do rio em que flui a nossa existência.
Dois dias depois, novo encontro. Ela ainda não havia dormido, mas o bebê estava bem. Trocamos sorrisos. Ela estava até cantando. E eu sabia a canção! Já havia cantado na igreja. Num arranjo desarranjado – sem trocadilhos com o local, afinal, era o banheiro – nós duas começamos a cantar juntas. Surreal, mas divino: Mesmo sem merecer, pecador, o mais miserável dos homens que sou; me envolves com seu amor e por isso, eu sou mais feliz”. Saí dali como se tivesse falado com Deus. Tudo era calma. Alma. Talvez tenha mesmo falado com Deus e também com um de seus anjos.

frases




Desassossego:
é quando seu coração
também bate num peito alheio...

(Bia Amorim)



"Ainda existe amor no fim do túnel,
mesmo que a fé e a esperança
estejam no retrovisor"

(Bia Amorim)

21.8.14

frase

"Vivemos dias tão acelerados, que também aceleramos todo nosso universo interno, desrespeitando nossos ritmos, nosso balanço, sobrecarregando nosso sistema emocional.
Com regularidade, nos atropelamos com nossas próprias questões e sufocamos emoções.
E mais um corpo (oportunidade, intenção, sonho) fica estendido no chão".
(Bia Amorim) 

20.8.14

Estímulo. A vida é feita dele.


Estímulo. A vida é feita dele. Há os internos e os externos. Há os coletivos e os individuais. São vários os tipos e podem surgir de onde menos se espera. Se é que se espera realmente. Algumas vezes sim. Atualmente estou em um trabalho que me consome bastante. Gosto, mas é extenuante. Há plantões nos fins de semana, ou seja, quando estou livre, quero tudo menos o computador. Respirar. Viver. Tirar do corpo o amarelo-escritório, a forma da cadeira do esqueleto, deixar a concha e ver o que o mundo reserva "lá fora". Ainda que cansada e sem tempo, tive vontade de voltar a escrever com mais assiduidade para o BibideBicicleta. Por que? O estímulo certo, oras! 

O blog existe há 8 anos. Bem nos primórdios, eu andava sozinha. Mas logo, logo apareceu gente para pedalar comigo. Foi motivo de muita alegria. Um desses ciclistas voltou! Depois de um longo inverno entre minhas letras e suas leituras. Mas sua volta, que alegria, trouxe o estímulo que eu precisava para acordar e continuar. J25, você me faz acreditar - outra vez - que as minhas palavras aqui geram sentido ou ocupam espaço na vida de alguém(s). 

Estímulo. Mesmo independentes, autoconfiantes, nós precisamos deles vez ou outra. Não falo do elogio, mas do estímulo certo para dar fôlego na caminhada. Talvez ele, o estímulo certo, esteja bem mais próximo de acontecer, que antes, para eu finalmente reunir os meus escritos e lançar um livro de crônicas.  O estímulo certo opera alguns pequenos milagres cotidianos. Um sorriso ou até um tapinha nas costas. Um e-mail do chefe dizendo que você está fazendo um bom serviço. O marido que elogia a comida/roupa/corpo/inteligência da mulher amada. Um desconhecido que te faz sorrir, porque leu algo que você escreveu e aquilo encontrou um sentido suficiente, um significado especial na sua vida. Um "Vamos lá, não desista!" naquelas horas em que o mundo parece querer te engolir. Naquele pequeno estímulo, você reconhece a grande força do universo. Propulsão. Voltei! Estimulada pelo meu leitor. Espero que não único! (risos).

16.8.14

Frase

"Hoje eu fiquei pensando que as relações de intensa convivência são como andar de slackline: tênue, arriscada, precisa de balanço e equilíbrio, paciência, foco, mas não deixa de ser uma divertida aventura...E o mais legal é que se você cair, pode começar tudo outra vez! Um divertido desafio" (Bia Amorim)

7.8.14

Lembrar. Viver. Sonhar.


Já preenchi muitas páginas com histórias. As minhas e as dos outros. Profissionalmente ou por lazer. Sempre com prazer. Vivi para ver e guardar instantes preciosos ou ouvi, para que todos conhecessem um pedaço daquela vida contada, narrada através da minha letra, da minha curiosidade, do meu olhar e do que o entrevistado tinha mesmo para dizer daquele instante na sua trajetória. Ouvi muitas histórias as quais não posso contar. Algumas aparentemente revivi junto enquanto a pessoa me contava (choro, rio, penso, me comovo, me entrego, compreendo, consolo. Tudo parte de mim)
Outras, escutando "ao pé do ouvido", imaginei à minha maneira, escrevendo com letras do pensamento nas páginas do coração. E lá estão e voltam vez ou outra. 

Depois de adulta, descobri a graça de ser filha e que viver histórias com a minha mãe - e com quem amo também - é o maior legado que me deixam, enquanto juntos (as) estivermos. Diferentes demais, ela e eu, mas com a dádiva de sonhar, escrever e viajar - em quase todos os sentidos bons que essa palavra pode conter. As vezes, antes de dormir, olho as fotos do que já fiz e registrei nessa vida. Ou lembro de passagens registradas com as tintas do sentimento apenas. E como é bom. Lembrar. Viver. Sonhar. Passado, presente e futuro inseridos nessa bela equação.