18.4.10

Tudo o que é sólido desmancha no ar

Foto: Spencer Tunick / www.spencertunick.com



No decurso dessa minha carreira tão diversa (e não diversificada, porque só faço mais do mesmo) – que a cada momento me encontro em um lugar diferente, ouvindo a história de pessoas de todo tipo e toda sorte - Já tive a oportunidade de entrevistar jornalistas, escritores, novelistas, roteirista. Vou me ater a eles (à classe), porque a pergunta que intriga é sempre a mesma: "qual o segredo de um bom texto?" É retórica, claro, uma vez que não existem fórmulas prontas, mesmo que existam certas regras estilísticas.

E qual o segredo de se fazer um texto? Criatividade e uma dose de suor? Experiência e empatia? Os meus textos nascem de formas diversas, mas cada um deles é dotado de sensibilidade, porque tanto quanto passar pela mente, as palavras que jogo no BibideBicicleta (e aqui fala a escritora e poeta e não a jornalista) passam sempre pelo coração. E nem essa premissa explica o ato (e nem garante nenhum tipo de sucesso, diga-se de passagem)! Há textos que fluem e outros que vão se formando como uma semente que brota no campo das ideias (centelhas). Ou epifania! Um "voilá" do pensamento instantâneo.

Estava com uma ideia forte e simples (e não há antagonismo nessa afirmação) na mente, quando entrei no blog da Isabela Campoi e li uma frase que martelou o pensamento em luzes de neon.



“Aí me lembrei de um comentário do Marshall Berman em seu livro "Tudo que é sólido desmancha no ar", título que é a apropriação de uma frase de Marx”.


"Tudo que é sólido desmancha no ar" é uma frase que jamais passaria batida a mim quando me deparasse com ela pela primeira vez. E assim o foi. É algo tão redondo diante da fôrma (como falarei essa palavra sem acento, meu Deus?) da minha formação, que eu mesma gostaria de ter dito (sem pretensão, vai!? Apenas uma frase que amei). Tem a minha embocadura. E lá fui eu atrás de Marshall Berman e sua motivação. Encontro no primeiro parágrafo do livro, a motivação primária que deu vazão a essa minha jornada de busca:

“Existe um tipo de experiência vital — experiência de tempo e espaço, de si mesmo e dos outros, das possibilidades e perigos da vida — que é compartilhada por homens e mulheres em todo o mundo, hoje. Designarei esse conjunto de experiências como “modernidade”. Ser moderno é encontrar-se em um ambiente que promete aventura, poder, alegria, crescimento, autotransformação e transformação das coisas em redor — mas ao mesmo tempo ameaça destruir tudo o que temos, tudo o que sabemos, tudo o que somos. A experiência ambiental da modernidade anula todas as fronteiras geográficas e raciais, de classe e nacionalidade, de religião e ideologia: nesse sentido, pode-se dizer que a modernidade une a espécie humana. Porém, é uma unidade paradoxal, uma unidade de desunidade: ela nos despeja a todos num turbilhão de permanente desintegração e mudança, de luta e contradição, de ambigüidade e angústia. Ser moderno é fazer parte de um universo no qual, como disse Marx, “tudo o que é sólido desmancha no ar””.

Quando Karl Marx disse que ‘tudo o que é sólido desmancha no ar’, ele fez uma feliz metáfora para definir ideologias, formas de governos e modos de produção que nasceram, vingaram e ruíram, como num ciclo de vida e morte quase natural. Da política do todo e de todos ao estado individual e particular da existência das coisas sólidas e materiais e da potencialidade das relações: vivemos em um ciclo natural do ser e do não ser mais. Tolo, talvez, seja aquele que tenta prever a duração e a durabilidade de coisas que nasceram para ter um ciclo natural, portanto, único.

E, vejam vocês que interessante (eu acho)! Trazendo o pensamento do plano das ideias para a parte prática de nossas vidas... Sabem de onde surgiu a centelha que me fez gerar toda a ideia e consequentemente, o texto? De um simples bate-papo virtual, que poderia ter passado batido, como tantos outros... Mas que para mim foi cheio de significado.

Eu – Seu blog, o meu e o dela têm uma leitora em comum. Acho isso tão diferente, até engraçado!

Ele – Tem muito mais gente. Somos uma corrente de elos fortes: prendemos as pessoas em nossa volta. E a corrente se matem e por nada se solta...

Eu – Somos a mesma corrente ou cada um é a sua própria? Esse por nada se solta é um mistério da vida: aquela instabilidade necessária à existência do cativar.


Tudo o que é sólido desmancha no ar. As coisas nascem, vingam e ruem como num ciclo de vida e morte quase natural. Tudo o que parece sólido é dotado da instabilidade necessária à existência do cativar. Cativar é alimentar a construção e permanência impermanente, sem foco nos prazos, mas no resultado que se obtém bem além do ciclo natural. Autotransformação e transformação das coisas em redor ameaça destruir tudo o que temos, o que sabemos, o que somos. E quando o somos, já não o sabemos, porque nos transformamos. E quando tentamos, debalde, impedir o processo: é retrocesso, caminhamos para a total estagnação do existir – morte em vida. “Coisifica-se”.

6 comentários:

Dani disse...

Para pensar: as vezes a intangibilidade decorrente do sólido que se desfaz no ar se faz mais presente do que a tangibilidade das coisas em si.Não acha?
Coisificar-se as vezes não é apenas estar, e não-estar nem sempre é não-ser... apenas provocando. é que eu adoro este livro hehehe. bjs

Bibi disse...

Dani:
1) "as vezes a intangibilidade decorrente do sólido que se desfaz no ar se faz mais presente do que a tangibilidade das coisas em si. Não acha?" - Acho sim! Há coisas no ar que deixam mais marcas - indeléveis - que aquilo se mostra construtivamente arquitetado, físico, presente...

2) Coisificar-senem sempre é não-ser me pegou! Mas tá certa! Cosificar-se pode também ser aquilo que não é por motivos tolos.

Adoro vc por aqui! Pode provocar sempre! O livro já está na lista das próximas aquisições!

Bela Campoi disse...

Uau, que boa inspiração, heim!? Adorei o post e suas reflexões. O livro é mesmo genial. Imagina Baudelaire, Goethe e Marx sendo analisados: amo!! Beijocas de Berlin!

Bibi disse...

Bela: agora me deu ainda mais vontade de ler o livro :) "Beijocariocas"

Dani disse...

Tenho o livro, pode vir pegar. Assim você visita o SEU sofá hehehe

Bibi disse...

Caraaaaaaaaaaaaaaaaca! O meu sofá! Meu, meuzinho? Superfashion! Massa! Vou correndo, mas só quando libertarem os dedinhos da escrava branquinha! hehe Ah, que fofa!