1.3.09

Paradoxos

( by slowernet )

Certamente estamos vivendo um tempo de paradoxos na nossa História. Ao mesmo tempo que construímos edifícios cada vez mais altos, nosso humor e paciência andam cada vez mais curtos [mais estresse, mais mal humor, mais mal tratos]. Elaboramos estradas cada vez mais largas, mas permanecemos com nosso ponto de vista estreito [unilateral, de mão única]. Gastamos mais dinheiro, porém temos cada vez menos. Compramos mais e desfrutamos menos. As casas são maiores e as famílias menores [partidas, convivendo em realidades baseadas em neuroses e não em simples afeto]; desenvolvemos mais possibilidades para garantir a boa conveniência e temos cada vez menos tempo para usufruir dessa virtude. Temos mais formação, mas menos sentido; mais conhecimento, menos juízo; mais especialistas e ainda mais problemas; mais medicina e menos saúde.


Vivemos um tempo de intensidades desenfreadas. Bebemos demais, fumamos demais, somos muito indiferentes [a tudo e a todos, inclusive aos nossos próprios sentimentos], rimos pouco, dirigimos rápido demais [somos loucos no trânsito e há muito tempo estamos perdendo a simples gentileza de ceder a vez, nem que para isso seja necessário empenhar a própria vida; como repetidamente observamos nos jornais], nos zangamos por/com tão pouco, passamos cada vez mais horas acordados e nos levantamos muito cansados; lemos pouquíssimo, vemos muita televisão e oramos tão raramente. Nós temos multiplicado as nossas posses, mas temos reduzido os nossos valores. Falamos demais, amamos raramente e odiamos com muita frequência. Aprendemos como é viver, mas não a ter vida [e vida em abundância. Vida que chama vida. Vida que nos leva à eternidade. Vida que nos direciona a encontros e desencontros. Vida que faz pulsar o sangue na veia e a balançar os "cabelinhos da venta" sem machucar a ninguém ou a si mesmo]. Acrescentamos anos à vida, não vida aos anos.


Paradoxo é perceber que o homem já pisou na Lua e voltou em segurança, mas continua tendo problemas para cruzar a rua e conhecer um novo vizinho [se dar a conhecer sem interesse, ser gentil]. Já mandamos naves para o espaço e podemos vigiar uma boa parte do Universo conhecido usando um grande telescópio, mas não conseguimos navegar com desenvoltura pelo nosso espaço interior. Fizemos grandes coisas, mas não necessariamente as melhores coisas. Limpamos o ar, mas poluímos a alma. Dominamos as menores partículas, mas não o nosso preconceito. Escrevemos mais e aprendemos menos. Planejamos mais e realizamos menos. Aprendemos a apressar nosso ritmo, mas não desenvolvemos a capacidade de esperar. Construímos mais computadores para armazenar mais informação e produzir mais cópias do que nunca, porém a nossa comunicação está cada vez mais deficiente [incipiente, relegada a segundo plano, deixada de lado, não codificada. Temos preguiça de ir em busca da comunicação e nos "deitamos" à sombra do falar sem parar, sem comunicar, sem preceber, sem sentir e sem sentido. Falamos muito de nós e quase nada sobre nós. Temos vergonha do que somos, porque muitas vezes nem sabemos direito quem somos e qual a nossa capacidade de melhorar e se superar. É mais fácil falar sem dizer e ouvir o que quer. Há momentos em que o silêncio perturba, porque nele é que se manifesta a nossa linguagem interna, que em dias de paradoxo anda gritando para tentar ser ouvida e encontrar sentido. Tornamo-nos tão somente reativos e antiparticipativos na questão da coletividade, porque não dominamos aquilo que é particular e individual].


Esse é o tempo da comida fast food e da digestão lenta; dos grandes homens de pequenos caráter; dos lucros imensos e relações superficiais. Esses são os dias em que existem dois rendimentos e tantas separações; casas incríveis, mas lares quebrados. Esses são dias de viagens rápidas, fraldas descartáveis, moralidade duvidosa, relações de uma noite apenas, corpos acima do peso e pílulas que fazem tudo para dar ânimo e acalmar e matar. Reparou que esse é o tempo em que há muita coisa para se ver na vitrine e cada vez temos menos artigos no estoque? Um momento em que a tecnologia pode levar até você um texto como este, por exemplo, e te dar a fração de segundo necessária para decidir se você pretende compartilhar tal pensamento ou simplesmente deletá-lo [do computador e da vida].


Então, é importante que você se lembre de passar algum tempo com aqueles a quem ama, porque eles não estarão ao seu redor para sempre [não somos, estamos. A vida é feita de momentos efemeros e instantes que podem parecer eternos]. Lembre-se de dizer uma palavra gentil a alguém que o admira e o vê como exemplo daquilo que quer ser, porque aquela pessoa pequena logo crescerá e deixará de fazer parte da sua guarda, do seu círculo [e provavelmente vai reproduzir o que viu em você. Atos falam mais que palavras. Gestos ensinam, palavras educam]. Lembre-se de dar um abraço gostoso em quem está ao seu lado, porque esse é o tesouro que você pode dar de coração e não te custará um centavo [quando você abraça alguém com vontade, os braços se entrelaçam em proteção e você encosta coração com coração, que passam a bater numa mesma sintonia, como se agora você possuísse um de cada lado do peito, desenvolvendo a mesma função. O calor do corpo do outro te acalma, a respiração do outro sopra fôlego de vida em seu sistema, suas cabeças se aninham em busca do aconchego].


Lembre-se de dizer, "EU TE AMO" ao seu parceiro e aos que muito quer bem, contudo, mais importante que dizer, é realmente sentir [e o desafio maior é amar àqueles a quem você não quer bem e ainda aos que não te querem bem]. Um beijo e um abraço tem o poder de reparar um dano terrível, isto quando você os oferta de/com toda a sua alma. Lembre-se de andar de mãos dadas sempre que possível e repartir com alguém um momento único, porque qualquer dia a pessoa não estará lá novamente [e nem o lugar e a hora terão a mesma geografia, importância, peso e intensidade]. Dê o tempo ao amor [o amor precisa de tempo para ser trabalhado, despertado, acomodado, encontrado e reencontrado, solidificado]. Perceba o tempo de falar e o de compartilhar pensamentos preciosos que habitam à sua mente.

7 comentários:

Rafael disse...

Lindíssimo!!!

Estou emocionado e vou dar aqui um "testemunho": eu efetivamente "aprendi a abraçar" há pouco tempo (dois anos, aproximadamente). É uma sensação deliciosa, de paz, de prazer, de passar e receber o bem.

Bia, quando vamos marcar um abraço? Já faz tempo, hein...

Beijos (e abraços)!

Anônimo disse...

Um belo post faz refletir e o mais necessario é mudar, aplicar e ser.
No transito mim transformo sou muito impaciente admito, nas relações preciso doar mais um pouco de mim.
Abraços...

Ana Martins disse...

Bibi, vc sempre encontra os textos mais-que-perfeitos, e como num passe de mágica, encanta e colore minha vida! Obrigada, menina!!! :)))

Bibi disse...

Rafa! O que vc anda fazendo? Abraço no shopping, bora?
Que bom que gostou do texto!
J25 vc sempre me encanta! Escrevo pensando no bem que posso fazer e vc sempre volta para contar! Uma delícia de ouvir! Não se iluda: escrevo para mim e para vocês. Há muito do quie digo que é lição para a mudança necessária à minha vida! Somos todos seres em construção!

Ana... O texto tem a minha digital. No que ele escreveu e no que eu complementei. Como disse, para mim e sobre mim!
A warm hug for you!

Saulo disse...

Meus elogios já são descarados e rasgados! O que falar de mais uma brilhante inflexão?! Perfeita!

Bibi disse...

Ah, fala! Eu gasto todas as palavras aqui e fico carente de letras! hehehe

Anônimo disse...

Acho fabuloso este post. Mas não concordo com a expressão:
"Aprendemos como é viver, mas não a ter vida".
Quanto a mim ensinam-nos e aprendemos a sobreviver, e nós, na nossa imensa ignorância confundimos isso com viver.
Está excelente.

Bom trabalho,
Daniel